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Há anos ocorrem ricos diálogos sobre Civilização Humana e Filosofia, Teologia, História e Cultura em geral! Tudo que possa interessar a alguém que espera da vida um pouco mais que outra temporada de BBB! Após diversos convites a tornar públicos estes diálogos, está feito! Quem busca uma boa fonte de leitura, por favor, NÃO VISITE este site. O que esperamos, de fato, é a franca participação de todos, pois não se chama “Outros Discursos”.

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Pelas divindades

O mundo contemporâneo não é religioso. Grandes dúvidas existenciais do tipo "o que é a morte?", "há algo depois dela?", "de onde veio a existência?", "Deus existe?", etc. foram abandonadas. Interessa a próxima roupa, o próximo cargo, a próxima transa, a próxima balada.

Embora as pessoas em geral tenham se afastado das grandes perturbações do passado, "as pessoas em geral" não é sinônimo de "todas as pessoas, sem exceção". Dialogo, portanto, com as exceções. Dentre as grandes discussões metafísicas, a maior e mais frequente é, parece-me, a discussão sobre a existência de Deus. Escolhi "Deus" no lugar de "deuses" pelo fato do pêndulo balançar quase sempre entre "O Deus cristão existe" e "o Deus cristão não existe". Há pouco espaço para outras divindades, como se representassem um nível inferior de crença, indigno de escrutínio.
Já disse em outra ocasião que a existência de Deus é passível de prova, enquanto a inexistência não é. Convém agora expandir este raciocínio:
·                     O próximo nível da inferência "a existência de Deus é passível de prova" é "a existência de (pelo menos) um deus é passível de prova". Com isto deixo o raciocínio mais coerente e absolvo-me do crime de ter desconsiderado outras religiões.
·                     A inferência "a inexistência de Deus não é passível de prova" não sofre upgrade, pois é inviolável desde que foi proposta. Convém apenas tornar minúsculo o "D" da divindade.
·                     Quando a revisão ora proposta me ocorreu pela primeira vez (sete minutos atrás) pensei numa inferência intermediária, pela qual uma vez efetivada a prova da existência de ao menos uma divindade a inferência seguinte seria enfraquecida pela prova da inexistência das demais divindades. Isto não é possível. A prova da existência de uma divindade não anula a possibilidade de prova de qualquer outra, ainda que a primeira divindade viesse pessoalmente ratificar que é única. Qualquer outra divindade permanece resguarda pela máxima "a existência de um deus é passível de prova". A inferência "a inexistência de deus não é passível de prova" permanece inviolável.
Retomei este assunto por ter prometido fazê-lo numa reflexão anterior (ver Milagres e Conquistas). Também o faço por tratar-se de tema recorrente nos diálogos das pessoas de meu convívio. É importante perceber que eu, que infiro convictamente que "a inexistência de deus não é passível de prova" não o estou fazendo em defesa de alguma entidade ou religião em particular. Eu não acredito em deuses nem em Deus, mas sou honesto ao reconhecer que é tolice procurar suporte empírico ou lógico para o ateísmo.
Outra questão é a seguinte: somos programados para fabricar deuses. Revestimos tudo de místico. Divinizamos com facilidade. Em minha infância morava em um sobrado. O vão sob a escada que levava aos quartos era a minha "garagem". Havia, porém, um problema. O lugar era muito escuro e minha bicicleta vermelha ficava lá no fundo. Como superar isto? Minha mãe não poderia ir comigo toda vez que eu quisesse a bicicleta. Meu pai instalou luz anos mais tarde. Neste meio tempo, dei um rosto para as "trevas" daquele ambiente. Dei-lhe nome ("Meu Amigo", mas poderia ter sido "Abba"), e ia buscar minha bicicleta conversando com ele. Pela relação de Temor, Respeito e Súplica, garantia não sofrer nenhum mal de sua parte e ainda conquistava minha tão querida bicicleta. Fico feliz que isto só tenha acontecido com um menino de sete anos com medo de escuro e que não se repita com adultos. Fico feliz em constatar que não existem religiões baseadas em Temor, Respeito e Súplica (não é?).
Dadas estas premissas, quero seguir ao ponto chave, o qual aprendi no Budismo, mas o qual o Budismo não ensina (nenhum texto budista ou pessoa budista com o mínimo de bom-senso ratificará minhas afirmações). O Budismo não é uma religião de ateus. Talvez seja composta por pessoas com mais fé que todos os teístas e ateus juntos. O budismo não nega a existência de qualquer divindade (embora algumas escolas tenham um panteão próprio). O Budismo apenas despertou para a irrelevância desta discussão. Ele despertou para as máximas que acabo de propor sem tê-las enumerado. Assim como há homens mais próximos da Iluminação e outros mais próximos do estado de inferno, há seres (ou pode haver, e isto é passível de prova, mesmo que jamais se efetive) em outros planos existenciais mais próximos do estado de Buda e há (ou pode haver) seres mais próximos do estado de inferno. Você, se religioso, pode chamar estes de demônios, aqueles de deuses e/ou anjos. Eu os chamo de "seres em outros níveis existenciais mais ou menos engajados na mesma busca por iluminação que eu", e sua existência é logicamente passível de prova, ainda que jamais se efetive; sua inexistência não é passível de prova, e isto é eternamente inviolável.

Ser Budista, para mim, é abandonar qualquer busca por ou discussão sobre divindades. Minha busca é pela manifestação de meu potencial máximo e isto é Estado de Buda. Lembra quando defendi que "a existência de (pelo menos) um deus é passível de prova"? Para tanto basta que algum deus eventualmente existente decida se apresentar abertamente. Se este evento ocorresse, haveria euforia na religião que o anunciava, caos e ruína nas demais. Eu, porém, não me converteria. Isto não é mais possível. Eu saudaria a divindade reverentemente, agradeceria sua visita e seguiria minha busca, na qual todo homem, demônio ou divindade será sempre bem vindo.

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