Não seria
nada original, de minha parte, traçar um raciocínio sobre a venda
de nosso tempo em nossas atividades profissionais. Queria seguir uma
linha paralela, sutilmente diferente.
Atualmente
vivo, ao lado de alguns bilhões de semelhantes, o drama da falta de
tempo. Nosso tempo é consumido no trabalho, na viagem até ele e de
retorno, nas atividades domésticas no curtíssimo intervalo passado
em casa, etc. Injusto ou não, não me cabe discutir isto. O fato é
que assim é. Examinemos isto um pouco mais de perto: "vender
tempo", algo tão raro e precioso, já é demasiadamente grave,
porém, o que se passa em nossa vida é ainda mais. Com o tempo
vendido vai nosso sono, nossa alegria, nossa saúde, nossa juventude.
Vendemos nosso corpo! Damos fragmentos irrecuperáveis de nosso corpo
e espírito para o deleite dalguns terceiros. Prostituição!
Resignamo-nos
frente às bofetadas diárias; revolta só em caso de atraso no
pagamento. A coisa vai mais longe. Recordo ter visto, em filmes ou
livros, relatos de prostitutas que formavam um vínculo com o
prostíbulo no qual desenvolvia-se uma dívida insuperável. O
"empregador" apresentava cálculos das despesas com
alimentação, vestimentas e acomodação que sempre excedia qualquer
ganho com a atividade das garotas, tornando-as prisioneiras por força
da dívida. Você não percebe, mas sua carreira, avanço acadêmico,
conquistas profissionais e materiais, assim como metas, sonhos e
desejos nada mais são que uma complexa teia construída por você
mesmo para te aprisionar ao prostíbulo. Você procura se aprimorar
profissionalmente para obter cargos e salários maiores,
paralelamente planeja o emprego destes recursos extras em viagens,
compras e mais aprimoramento profissional.
Sua dívida
é insuperável. Dizer que não usa cartão de crédito, só faz
pagamentos à vista e põe no Excel até a compra de uma bala não
alivia a situação. A ausência de dívidas é ilusão. O controle
de despesas é ilusão. A suficiência financeira é ilusão. Tome
agora o telefone, ligue para seu empregador e avise que decidiu não
trabalhar por um ano. Vá para o Uruguai (ouvi dizer que é um ótimo
lugar), esqueça da vida e escreva um livro. Você é livre para tudo
isto? Você é livre para uma destas ações? Estou sendo radical? É
evidente. Sem vislumbrar o extremo oposto você não será capaz de
perceber o extremo absurdo ao qual você está abraçado. Nós nos
enredamos de tal forma que não consigo propor saída. Posso, porém,
estimular o primeiro posso rumo a ela. Primeiros passos:
- Reconheça o prostíbulo
- Reconheça sua dívida
- Reconheça que foi você quem a tornou insuperável
- Olhe ao redor e aprenda a reconhecer o supérfluo. Supérfluo de verdade, não o que lhe é conveniente
- Você precisa mesmo de celular pospago?
- Há lugar no qual chegue o carro importado no qual não chegue o popular?
- Era preciso ter posto tanta comida no prato?
- Há em casa tantos moradores quanto o alimento adquirido?
- Aquela folha poderia receber texto no verso?
- Aquele texto precisava ser impresso?
- Aquela roupa era imprescindível?
- Aquela marca era imprescindível?
- Quantos livros você leu?
- Quantos escreveu?
- Quanto tempo passa falando dos outros?
- Se é crente, quanto tempo passa orando?
- Quando vai estar com outros o que te preocupa mais, tuas roupas roupas ou ter o que dizer?
- Qual a proporção entre seu tempo nas médias sociais e seu tempo com um livro?
- Com que frequência vai ao shopping?
- Com qual frequência entra na livraria do shopping?
- Você ainda se lembra qual a textura da casca da árvore?
Estes
são primeiros passos duma longa caminhada. Melhor! Somos os
primeiros membros de uma passeata: A passeata pelo fim da
Prostituição
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